19 de mai. de 2012

O eu é outro: retratos pintados


Escrituras em pedra, pergaminho, imprensa, publicação em livros, internet... saberes que deixaram de existir somente no papel, estão também na tela, no mundo diverso e flutuante das novas tecnologias.

Conhecimento que se transforma, desconstrói, reinventa e que deixa a materialidade física e ganha a virtualidade; conhecimento que muda de lugar, que não é mais de uma única fonte, mas pode ser produzido, alterado por mim ou por você, por qualquer um; conhecimento que outrora podia ser guardado no armário, e que hoje está no mundo, no universo da mobilidade, da profusão, da ubiquidade.

Quantas transformações ocorreram... mas parece que foi ontem! É que apesar do relógio continuar o mesmo, os ponteiros do tempo parecem correr apressadamente, e a cada segundo surgem inovações. Ainda assim, me resta a lembrança de minha relação com o conhecimento enciclopédico, no qual a riqueza e a diversidade do mundo estavam impressos nos volumes da Barsa, ou dos almanaques, como o Lunário Perpétuo. Fontes valiosas não apenas para os estudos, também um caleidoscópio pela qual eu podia ver e conhecer o Outro, outros países, outras culturas, outras vivências e também pude me conhecer, estudando a anatomia e o funcionamento do corpo humano e de minha cultura.

Nessa volta no tempo, meu trabalho é também uma releitura de retratos pintados, técnica tradicional que caiu em desuso, mas que ainda persiste como relicário, como espaço da memória e da subjetividade. Assim, compreendo que sou agente fundamental nessa relação entre o eu e o Outro.

Tão cômodo separar esses dois lugares, instituir esse distanciamento, porém eu não me conheço sem o Outro, eu não sei eu sem o Outro. Como destaca Bakhtin, eu sou inacabado, é o Outro que me completa, que me constitui, pois tudo que me diz respeito a começar pelo meu nome vem de fora, vem da boca dos Outros.

Compreendo que assim como as enciclopédias impressas, também os retratos pintados caíram em desuso, adormeceram no tempo. E ao remexer esse baú de histórias e memórias, me deparo com o sonho, com a imensidão íntima, como relembra Bachelard. Imensidão, que é um mergulho não apenas em mim, mas também no Outro, nos Outros e que pode estar também na casa, na sala ou no quarto, nos cantos e frestas, nos espaços infinitos. 


 Dalton Paula
Retrato Silenciado
28,5 cm (vertical) x 220 cm (horizontal)
Óleo sobre livro
Instalação
Foto: François Calil
2010





Dalton Paula
Retrato Silenciado
Detalhe 1
Óleo sobre livro
Instalação
Foto: François Calil
2010






Dalton Paula
Retrato Silenciado
Detalhe 2
Óleo sobre livro
Instalação
Foto: François Calil
2010


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