3 de jun. de 2012

O Batedor de bolsa


Apresento aqui um pouco da experiência do que foi fazer a performance, e a vinculo com elementos que constantemente perpassam as séries, reforçando algumas ideias e questões já abordadas, o que tem me possibilitado um amadurecimento, e uma maior compreensão dos conceitos e do próprio trabalho em si, que considero ainda em processo. Na performance, são explorados objetos que são símbolos, apresentam códigos sociais na vivência cotidiana. Remetem às pessoas que as utilizam e os papéis sociais que elas ocupam, bem com aos lugares para os quais são destinados e dessa forma, também suas cargas simbólicas. Tais objetos são deslocados e levados a um jogo metafórico para propor questões, uma tentativa de abstrair aspectos críticos dos temas propostos.

Em suas reflexões sobre o propósito da arte, Cohen (2011) questiona se ela deve representar o real, recriá-lo ou criar outras realidades. E nesse contexto, o autor indica que a performance acaba atingindo novas situações e percursos, tênues limites que separam a vida da arte. E deste modo, ele situa essa linguagem em um âmbito mais amplo, numa maneira de encarar a arte, de vê-la numa constante procura por se aproximar da vida, e assim também do que é espontâneo e natural, constituindo o live art:

“um movimento de ruptura que visa dessacralizar a arte, tirando-a de sua função meramente estética, elitista. A idéia de resgatar a característica ritual da arte, tirando-a de “espaços mortos”, como museus, galerias, teatros, e colocando-a numa posição “viva”, modificadora” (COHEN, 2011, p.38).

Também abordo a perfomance nesse sentido, pois a relaciono com minha vontade e os caminhos do trabalho para direcionar as ações, no intuito de buscar na realidade, aquilo que ela tem de mais pulsante, e que seja capaz de fugir da representação tradicional.

Na performance, parto do “Corpo Silenciado”, com o muro e sua natureza pictórica, e adiciono novos elementos: uma bolsa feminina preta, um cassetete policial, uma calça social marrom, uma botina bege e uma venda preta nos olhos. Em tal cenário, coloco o corpo em ação, elaboro uma metáfora da pinhata (em espanhol, “piñata”), uma brincadeira tradicionalmente popular no México. Constituída por um recipiente normalmente de cerâmica envolto por papel crepom, ela pode ter inúmeras formas, em especial a estrela de sete pontas, e também personagens de desenho animado. Tal objeto, que é preenchido com doces e guloseimas, fica suspenso no ar, numa altura média de 2 metros; e o jogador, de olhos vendados tenta acertá-lo com um porrete, espalhando os doces por todo o local. Apesar de ser mais comum entre crianças, adolescentes e adultos também participam desse jogo, que no Brasil é conhecido como quebra-panela ou quebra pote. Normalmente no tradicional sábado de aleluia, também fazemos uma brincadeira semelhante, a malhação do Judas, na qual se suspende um boneco em tamanho aproximado ao corpo humano, que é esbofeteado, desfigurado, e até mesmo queimado.

Em “O Batedor de Bolsa” trabalho com o cassetete e a bolsa como extensões do corpo, do eu e do outro, prolongamento simbólico, material e subjetivo do desejo, imaginações, ações e reações do corpo na vida cotidiana.

Nesse sentido, faço uma analogia entre essa relação com a alteridade e uma ampulheta, que aqui possui em seu interior não apenas areia, mas também o eu e o outro, e com o transcorrer do tempo, senti-me sufocado, soterrado pela areia, que simboliza todas essas ações vivenciadas no cotidiano e com as pessoas. No entanto, como uma reação a tudo isso, tal corpo precisa ser “virado”, para assim como essa ampulheta imaginária, que recomeça a registrar novamente o tempo, ele possa reagir, se renovar.

COHEN, Renato. Performance como linguagem. 3 ed. São Paulo: Perspectiva, 2011. 256 p.

*Este texto faz parte do trabalho de conclusão de curso "Corpo Silenciado". 








Dalton Paula
O Batedor de bolsa
2011
Fotografia
60 x 270 cm
Foto: Mário Souza / Tratamento de imagem: Heloá Fernandes




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